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quarta-feira, 20 de outubro de 2010

A conquista do oeste

Construir uma cidade como Brasília no meio do nada pode ser considerado uma continuação da política de Vargas. Vejamos como. O governo Vargas, principalmente durante o Estado Novo (1937-1945), pretendeu construir um Estado capaz de criar uma nova sociedade e de produzir um sentimento de nacionalidade para o Brasil. Uma dimensão-chave desse projeto era a geopolítica, que tinha no território seu foco principal. Não por acaso foram criadas então instituições encarregadas de fornecer dados confiáveis para a ação do governo, como o Conselho Nacional de Geografia, o Conselho Nacional de Cartografia, o Conselho Nacional de Estatística e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), este de 1938. Essas agências ajudariam o Estado a formular e implementar suas políticas destinadas a vencer os "vazios" territoriais e a pouca interação da rede urbana.


A noção de "vazio" territorial atualizava o conceito de "sertão", entendido como um espaço abandonado que desde as denúncias de Euclides da Cunha vinha preocupando as elites brasileiras interessadas em construir uma nação. Por outro lado, as áreas ocupadas do Brasil eram vistas como um arquipélago, onde cidades ou regiões pouco tinham a ver entre si. A criação 1937 do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) indica sem dúvida a importância das estradas como instrumento de comunicação entre as regiões e as cidades.


Foi assim também que, em 1940, Vargas lançou a chamada "Marcha para o Oeste", como uma diretriz de integração territorial para o país. E o fez durante os festejos de inauguração da cidade de Goiânia. Essa cidade, obra do interventor Pedro Ludovico Teixeira, foi projetada pelo arquiteto Attílio Corrêa Lima, o mesmo arquiteto que estaria envolvido com a construção da cidade industrial de Volta Redonda, outro projeto estratégico do governo Vargas. Volta Redonda condensava a promessa de progresso que o governo Vargas apresentava, de um Brasil urbano, industrial, moderno e com alto padrão de vida.


A Marcha para o Oeste retomava nossas antigas tradições coloniais e valorizava principalmente a figura do bandeirante, considerado o grande herói nacional, já que fora ele o responsável pela efetiva conquista do território nacional. Com tal iniciativa, segundo o discurso de Vargas, o Brasil estaria reatando a campanha dos construtores da nacionalidade, ou seja, os antigos sertanistas.


A ação política concreta do Estado Novo se fez sentir com a criação dos territórios federais em 1943: Amapá, Rio Branco (atual Roraima), Guaporé (atual Rondônia), Iguaçu e Ponta Porã. O governo federal atuou também na região de colonização do norte do Paraná, o que deu origem a uma série de novas cidades como Londrina, Maringá, Cianorte, Umuarama.


No início dos anos 40, os poderes públicos federal, estadual e municipal – estávamos na ditadura, e estados e prefeituras eram controlados por interventores - estiveram envolvidos com projetos de reformulação das cidades antigas, de elaboração de planos diretores, de abertura de grande avenidas. Os prefeitos interventores participaram ativamente desse processo, como aconteceu no Rio de Janeiro, com Henrique Dodsworth, em São Paulo, com Prestes Maia, e em Belo Horizonte, com Juscelino Kubitschek. Curitiba, Porto Alegre e Recife também foram objeto de remodelação e receberam grandes obras viárias.


As linhas mestras da "política territorial" - políticas de povoamento, regulando o deslocamento populacional, de transporte e de comunicação - do governo Vargas seriam retomadas por JK. Como prefeito, governador e presidente, JK também investiu em políticas de transporte e comunicação e realizou, por fim, o sonho de completar os vazios do território e preencher as lacunas da nacionalidade. A construção de Brasília pode ser entendida como uma nova "Marcha para o Oeste", já que deslocou populações (os chamados "candangos", principalmente migrantes nordestinos) para os sertões e possibilitou que os equipamentos da vida urbana chegassem a uma região que os desconhecia. Mais que isso, levou o poder central para o interior e serviu para iniciar um processo de deslocamento da modernização brasileira do Centro-Sul para o Centro-Oeste.


A imagem dos candangos como modernos pioneiros que retomam o trabalho dos velhos bandeirantes aparece em texto de Tom Jobim que acompanha o disco, lançado em 1961, com a gravação da Sinfonia da Alvorada, obra encomendada a ele e a Vinícius de Moraes para celebrar a construção de Brasília.





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